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 "Naquele tempo toda a humanidade falava uma só língua. Deslocando-se e espalhando-se em direção ao oriente, os homens descobriram uma planície na terra de Sinar e depressa a povoaram. E começaram a falar em construir uma grande cidade, para o que fizeram tijolos de terra bem cozida, para servir de pedra de construção e usaram alcatrão em vez de argamassa. Depois eles disseram: “Vamos construir uma cidade com uma torre altíssima, que chegue até aos céus; dessa forma, o nosso nome será honrado por todos e jamais seremos dispersos pela face da Terra!" O Senhor desceu para ver a cidade e a torre que estavam a levantar. “Vejamos se isto é o que eles já são capazes de fazer; sendo um só povo, com uma só língua, não haverá limites para tudo o que ousarem fazer. Vamos descer e fazer com que a língua deles comece a diferenciar-se, de forma que uns não entendam os outros.” E foi dessa forma que o Senhor os espalhou sobre toda a face da Terra, tendo cessado a construção daquela cidade. Por isso, ficou a chamar-se Babel, porque foi ali que o Senhor confundiu a língua dos homens e espalhou-os por toda a Terra."
Gênesis 11:1-9

Moral da história

O que se passa na história é que os homens desejaram algo (se manter unidos na terra) e sentiram medo de não ter esse algo. Por isso, elaboraram pela própria inteligência uma solução do que impediria a realização de seu medo (ter fama na terra e alcançar os céus). Com o entendimento próprio, concluíram que aquilo que sabiam fazer (construir coisas com tijolos) era suficiente para conseguirem a posição de destaque de almejavam. No fim, aquilo que jugaram ser o meio que traria o que pensavam ser a solução na realidade foi a causa da realização do que tinham medo. Pois Deus, ao ver o homem cogitar ser capaz de se erguer aos céus por esforço próprio o derruba e destrói.


Analisando os fundamentos do medo

Esses homens que planejaram construir a torre eram os descendentes de Noé. O capítulo anterior é a genealogia dos descendentes de Noé, só haviam descendentes de Noé na terra. Isso é  muito importante de se saber. Os pais e avós deles foram protegidos por Deus na arca. Foram as únicas pessoas do mundo que foram preservadas da trágica morte por afogamento, e agora eles estão sentindo medo de serem espalhados pela terra e buscando salvação para o problema baseado nos próprios esforços ao invés de confiar que a solução vem de Deus.

O capítulo anterior mostra que esses que foram espalhados pela terra eram os da descendência de Canaã, que havia sido amaldiçoada por Noé. É possível que eles temessem ser espalhados por saberem estar debaixo de uma maldição e por isso tentaram, pelo próprio esforço, se livrar da maldição. Eles viram a consequência da desobediência, como era terrível, e ao invés de temer a Deus que traz maldição a quem transgride sua lei,  eles temeram a maldição em si mesma, e o meio para impedi-la foi a ilusão de ser como Deus, por meio das próprias ações.

Quantas vezes nós analisamos nossos medos para ver quais as bases dele? quantas vezes tememos mais as consequências de uma transgressão da lei do que o Criador da lei? Devemos examinar a nós mesmos, e buscar encontrar quais são os nossos medos e se eles tem fundamentos. Devemos ver se nossos medos não são consequências de transgressões e ao invés de caçar soluções pelo próprio entendimento, devemos temer o que realmente devemos, a Deus, entregar nossas ansiedades e buscar seguir o que Ele manda. O tolo teme as coisa que estão debaixo do controle do Criador, enquanto o sábio teme somente o Criador que controla todas as coisas. Esse é o princípio da sabedoria.


Sobre a solução para o problema temido

E se ao invés de buscar uma solução para se tornarem como Deus, eles pegassem esse medo de dispersão pela terra, fossem até Deus e dissessem o medo e a razão. Deus não os protegeria? Mas eles procuraram soluções do próprio entendimento, e o próprio projeto que parecia ser a solução foi a causa da ruina e da realização do que mais temiam.

A solução ilusória deles, a cisterna rota deles, foi a honra, e o meio para a honra foi a torre. A ideia para a torre, foi ter conseguido fazer tijolos com a própria mão. Primeiro, descobriram como fazer algo com as próprias mãos (Tijolo), deu certo, e então cobiçaram honra, pois viram naquilo a solução pelas próprias mãos para resolver seu problema. Se eram capazes de fazer tijolos, então eram capazes de fazer um cidade e uma torre e isso traria a segurança, pelas próprias mãos.

A honra é um atributo divino, a capacidade de permanecer no mesmo lugar seguro também. Em outras palavras, eles desejaram ser como Deus. Isso está muito claro em Gálatas, é a natureza carnal e seus frutos. A minha maior ferramenta de análise da realidade tem sido o livro de Gálatas, pois não tem falha alguma. Todo erro humano é produto de sua natureza e réplica do que se passou no Jardim, o desejo de ser como Deus. Todo homem natural odeia a Deus pois o cobiça, quer ser como Ele. Além de que não tem nem a capacidade de enxergar que essa é a sua circunstância, que é por isso que faz ou deixa de fazer uma ação, tudo gira em volta desse desejo, que está no sangue.

Isso pode ser replicado nos dias de hoje de tantas maneiras. Uma pessoa, ao ver que consegue ganhar 1.000 com o seu próprio esforço, como resultado de um projeto que deu certo, pode aumentar seu plano de lucro para por exemplo 10.000 e pensar em ganhos infinitos, e nisso, ao ver o resultado do próprio esforço, enxergar que a consequência das próprias capacidades é um meio para impedir que o que ela teme ocorra ou que o próprio trabalho a torne independente de Deus. Alguns temem a solidão, outros temem não ter comida ou roupa de qualidade, outros temem serem mal vistos pelos outros. Também pode-se considerar uma torre de babel toda presunção de se elevar aos céus por meio de algo vindo de si próprio. É depositar a confiança nas coisas criadas ao invés do Criador.


Sobre as ação de Deus na história

A segunda parte da história é praticamente a ilustração prática de provérbios 10.24: "Aquilo que o ímpio teme, isso lhe sobrevém; o que os justos desejam Deus lhes concede". Deus castiga os ímpios fazendo com que seus medos se tornem realidade. No caso, a própria ação que se imaginava que seria a solução trouxe o que era temido. Também mostra como as circunstâncias que acontecem na terra são controladas e limitadas por Deus. Os ímpios podem ter poder, mas tudo o que eles fazem está sendo observado e controlado.  Provérbios 16:9: "Em seu coração  o homem planeja o seu caminho,  mas o Senhor determina os seus passos".  Refletir sobre o governo de Deus no mundo, como tudo está debaixo de sua observação e intervenção constante dá uma paz imensa. Isso explica o porque que aquele que vive no esconderijo do altíssimo descansa no sombra do todo poderoso. Pois, mesmo com todas as circunstâncias sendo adversas, ele sabe que não há nada que não esteja no controle de Deus. E ele não acredita de forma apenas teórica, mas genuinamente confia nisso, por isso tem paz. É comum ver no meio religioso um desespero muito grande por política, como se a salvação viesse de um político específico e como se as ações de um político mal não estivessem sendo controladas por Deus. Como se a própria vida do político mal não tivesse sido dada e mantida por Deus. Deus está no controle de todas as coisas, do mesmo jeito que controlou a terra para impedir o mal que os seres humanos iriam causar naquele momento, Ele controla hoje. Como Paulo disse, todo governante é posto por Deus, mas pessoas tem uma dificuldade imensa de acreditar nisso, agem como os homens de Babel, preferem acreditar no próprio medo, na solução gerada pelo próprio entendimento do que ir a Deus que é a fonte das bênçãos e maldições. Ou até vão a Deus, mas vão pedindo (se não ordenando) tudo o oposto do que Ele manda e acrescentam um "em nome de Jesus" ao final da oração, como se fosse uma fórmula mágica, como se ao dizer essas palavras, toda a oração contrária aos ensinos de Jesus estivessem sob o nome de Jesus.
Tudo isso é cavar cisternas rotas. o tolo não teme a Deus (Provérbios 1:7), mas teme as circunstâncias da vida passageira. Se o nosso temor for de circunstâncias temporais, com certeza o nosso medo virá sobre nós. Temos que ter medo de Deus e do seu juízo final, não de suas maldições temporárias.


Sobre a confusão das línguas

Deus, para destruir o plano dos ímpios, usou o método de fazer com que uma pessoa não entendesse o que a outra dizia. Sabemos que satanás imita o que Deus faz de forma deturpada, com a intenção de causar o mal. Se Deus, para o bem, destruiu um plano mal pelo meio de impedir que uma pessoa entendesse o que a outra dizia, pode-se pressupor que satanás use do mesmo método para tentar destruir planos bons. É interessante observar como os planos são destruídos a partir do momento que as pessoas que o estão executando deixam de se entender. Por isso é necessário se certificar de ouvir com atenção e garantir que entendeu o que o outro quis dizer, pois ruídos na comunicação podem trazer danos graves.

"Não chamem conspiração a tudo o que este povo chama conspiração; não temam aquilo que eles temem, nem se apavorem. Ao Senhor dos Exércitos é que vocês devem tratar como santo, é a Ele que vocês devem temer, é dele que devem ter pavor."
Isaías 8:12-13


O novo testamento nos revela que a salvação se dá puramente pela graça, sem mérito algum do ser humano, pois está escrito: "Porque pela graça sois salvos, por meio da fé, e isso não vem de vós; é dom de Deus, não por obras, para que ninguém se glorie" (Efésios 2:8-9) e "Ele nos salvou, não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, pelo lavar regenerador e renovador do Espírito Santo" (Tito 3:5). De fato, a salvação só pode ser pela graça por meio da fé, nesse ponto todos os cristãos estão de acordo. Mas, referente ao modo como essa graça opera, há duas visões distintas: A da graça preveniente (doutrina arminiana) e a graça irresistível (doutrina reformada).

No arminianismo clássico, a graça previniente se refere a doutrina de que o Espírito Santo concede a todos os homens um tipo de graça onde eles são libertos do pecado original e parcialmente regenarados para poderem livremente decidir se aceitam ou não o evangelho. Na definição de Roger Olson:

“A graça preveniente é simplesmente a graça de Deus convincente, convidativa, iluminadora e capacitadora, que antecede a conversão e torna o arrependimento e a fé possíveis. Os calvinistas interpretam-na como irresistível e eficaz; a pessoa na qual esta graça opera irá se arrepender e crer para salvação. Os arminianos interpretam-na como resistível; as pessoas sempre são capazes de resistir à graça de Deus, conforme a Escritura nos adverte (At 7.51)”                                                                          Teologia Arminiana: Mitos e Realidades, Roger Olson.

A principal questão com a suposição de uma "natureza temporariamente neutra" é a de que: o que faz um homem aceitar a oferta e outro não? Se ambos estão igualmente cegos quanto a Deus, e ambos recebem graça na mesma proporção, porque um aceita e o outro rejeita? Por que a vontade de um é mais correta do que a de outro? Se o objetivo da graça é tornar o pecador "neutro", o que o tira do estado neutro e o leva para o sim ou não? Qual é o fator que confirma sua fé? Pode-se deduzir, de forma consciente ou não, que se um aceita baseado em alguma convicção interna sua que está além da graça, é porque algo no entendimento próprio (seja inteligência, vontade, consciência, genética ou o que for) dessa pessoa é melhor, mais correto, do que há no da outra. Me parece um atentado contra a justificação somente pela graça (Tito 3:5-7), pois no caso, a graça é insuficiente por exigir algo além dela, algo que vem do próprio ser humano. 

Não há algo na bíblia como um estado intermediário de natureza. Cristo disse: "O que nasce da carne é carne, mas o que nasce do Espírito é espírito." (João 3:6) e Paulo nos informa em Gálatas 5:17: "Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si" Como então é possível que algo que parta do próprio ser humano (carne) possa ser favorável a algo que é do Espírito (fé), sendo os dois opostos? (Romanos 8:7–8; 1 Coríntios 2:14; Efésios 2:8–9). Cristo ensinou que as decisões de todas as pessoas não são aleatórias, mas reflexos de sua natureza: "Assim, toda árvore boa produz bons frutos, e toda árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa dar maus frutos, nem a árvore má dar frutos bons." (Mateus 7:17-18) (Lucas 6:45). Se a resposta do homem sempre vai ser baseada em sua natureza, e nesse "estado intermediário" a sua natureza é neutra, segue-se que o homem não tomaria decisão alguma, permaneceria neutro quanto ao assunto, pois, por sua vontade natural o negaria, pela vontade divina o aceitaria,  pela tal vontade neutra ele permaneceria neutro.  Para manter a conclusão de que o ser humano pode optar por escolher ou negar a Deus livremente seguindo a coerência lógica, seria preciso, como Finney fez, remover a premissa de que há uma corrupção natural no homem que o faz se inclinar para o mal, mas ao fazer isso, se estaria negando afirmações explicitas de Paulo. Além de que essa "regeneração parcial" e "estado intermediário", caso verdadeiros, deveriam estar claro nas escrituras, o que não ocorre. 

Alguns alegam que ambos reformados e arminianos creem em uma graça preveniente, com a diferença de que a graça preveniente reformada é irresistível e a graça preveniente arminiana é resistível. Essa afirmação não é precisa. A visão reformada é a de que um homem só pode ter fé após a regeneração, pois a fé é um dom espiritual; ao contrário da visão de que a fé é o requisito para que o homem seja regenerado. Alguém não regenerado não poderia ter fé pois, como disse, ela estaria vindo de si mesmo e isso é impossível (1 Co 2:14). Se o Espírito desse um pouco de fé e aguardasse o ser humano fazer o que quiser com ela, ele, por sua própria natureza a desprezaria, a menos que houvesse bem em si mesmo e o bem do humano vem totalmente de Deus. Novamente, uma possibilidade impossível no caso de depravação total. 

Na parábola do semeador, Cristo diz que aqueles que ouvem a mensagem, retêm e produzem frutos são aqueles os quais a mensagem foi plantada em terreno fértil, que é o coração bom e honesto (Lucas 8:11-15). A primeira vista, essa afirmação parece contradizer as outras sobre o coração do homem, como em Gênesis 8:21; Eclesiastes 9:3; Jeremias 17:9; Marcos 7:21-23;  Efésios 2:1-3. Quando a bíblia se refere ao coração do homem, ela diz que é enganoso e corrupto, que é o exato oposto de honesto e bom. Como pode então a semente ser plantada em terreno fértil, se todos os terrenos são estéreis por natureza. Bem, essa é a graça do Espírito. Está escrito: “Dar-vos-ei um coração novo, e porei dentro de vós um espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos darei um coração de carne."  e “...não pelas obras de justiça praticadas por nós, mas segundo a sua misericórdia, ele nos salvou mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, que ele derramou sobre nós ricamente por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador.". Desse modo se conclui que é o Espírito que torna o solo fértil para que a semente seja semeada em um lugar propício. E também que se há corações férteis, é porque o Espírito os tornou assim, não por sua própria natureza. Se a graça fosse realmente dada a todos, e nem todos se tornassem férteis, estaria se assumindo que a operação do Espírito foi ineficaz em tornar um coração enganoso e corrupto em um bom e honesto, o que é impossível. Conclui-se que a fé é a consequência da regeneração e não a causa pois um coração bom e honesto é um coração regenerado.

Argumenta-se que levando a risca desse modo o que a bíblia ensina, se elimina a liberdade humana e por isso a interpretação do que Paulo diz deve ser algo oposto do que aparenta ser. É necessário definir no que consiste a liberdade. O que se entende por liberdade costuma ser a possibilidade de escolher entre dois opostos, mas esse é o conceito bíblico de liberdade? se fosse assim, Deus seria livre, considerando que ele não pode optar pelo mal, por ser contrario a sua própria natureza (Tiago 1:13; 2 Timóteo 2:13; Hebreus 6:18)? Paulo diz: “...para que, mediante duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, tenhamos forte alento, nós que já corremos para o refúgio, a fim de lançar mão da esperança proposta.” Se é impossível que Deus minta, Ele não é livre? Muito pelo contrário, sua impossibilidade de mentir revela sua liberdade, pois, caso mentisse, a própria verdade (João 14:6) seria escrava da mentira, o que é uma impossibilidade lógica. O que a bíblia apresenta como liberdade é a prática do bem, ou a impossibilidade de praticar o mal, isso é ser livre (João 8:34-36; 2 Coríntios 3:17; Tiago 1:25; Salmo 119:45; Gálatas 5:1, 13).  Já está provado tanto no que consiste a liberdade, quanto que o homem natural não a possui, apenas o homem regenerado. 

Depois, se argumenta que esse modo de salvação não é justo, que Deus teria que ser mal caso criasse pessoas que iriam ser condenadas. Primeiro, quem determina o que é justo ou não é Deus. Assim como no caso do problema do mal, não cabe a mim, como criatura, usar do meu padrão de moralidade para julgar a Deus e sua ações para determinar se é justo ou não. O que me compete é buscar entender o que Ele revela sobre si e simplesmente crer, sem tentar adicionar nada que, ao meu próprio entendimento, parece mais justo. Se em João 6:37 Cristo disse que os que vão a Ele são os que o Pai o dá, não cabe a mim questionar as razões do Pai, apenas aceitar até onde Ele quis revelar. A segunda questão é "problemática" tanto no calvinismo quanto no arminianismo, pois, em ambos os esquemas teológicos, Deus sabia quem seria condenado e ainda sim criou essa pessoa. Isso o torna responsável pelo mal? de modo algum, pois não é Ele que induz ninguém a pecar, e sabemos que Ele odeia profundamente todos os pecados. Esse tipo de questionamento aparentemente paradoxal leva a questão do problema do mal, que pode ser abordada em outro artigo.

"Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor. Porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos."
Isaías 55:8-9





"Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes.  Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, depois de terdes vencido tudo, permanecer inabaláveis.  Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da justiça. Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz; embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno. Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus; com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos e também por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez, fazer conhecido o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador em cadeias, para que, em Cristo, eu seja ousado para falar, como me cumpre fazê-lo."
Efésios 6:10-20

O apóstolo inicia o capítulo nos instruindo contra um erro muito comum, o de achar que estamos travando uma luta contra as pessoas que praticam o mal (carne e sangue) ou que temos a capacidade de impedir o mal controlando o comportamento das pessoas. Ele esclarece que nossa luta é contra a origem desse mal (principados, potestades e príncipes das trevas nas regiões celestiais). Ou seja, não lutamos contra um mentiroso, mas contra o pai da mentira. Na idade média se costumava pensar que a luta era contra a carne e sangue, por isso se praticava ascetismo e guerras por razões religiosas. Logo após Paulo esclarece, passo a passo, de forma ilustrada para facilitar a compreensão, de que modo essa luta deve ser feita. 

Ele ordena que nos fortaleçamos no Senhor e na força de seu poder, que é receber em nós a força que vem do Senhor. Essa ordem de se fortalecer no Senhor nos revela que para sermos fortes dependemos do Senhor. Isso significa que uma pessoa que não está em comunhão com o Senhor não possui força, pois o modo como a força vem ao ser humano é através do Senhor, estando nele. Esse é uma alerta de que, se queremos ser fortes, devemos estar em um estado de conexão profunda com Deus, em contato diário. Ser forte no Senhor também anula todas nossas desculpas de fraqueza, pois, se a força é do Senhor e através ela fazemos as coisas, não temos mais desculpas para deixar de fazer o que é de nossa obrigação, toda a disposição necessária para fazer o Senhor já concedeu e a nós cabe apenas confiar e partir para a ação. O modo que nos dá para nos fortalecemos é nos revestindo da armadura completa de Deus, com os objetivos de:

  • Permanecer firme contra as ciladas do diabo;

Permanecer firme é resistir, e é o oposto de ceder, fugir ou ser derrubado. O texto repete "permanecer firme" 3 vezes.

  • Poder resistir no dia mau;

Provavelmente o dia de alguma tentação ou dificuldade em especial.

  • Permanecer inabalável após ter feito tudo.

Feito tudo o que é da obrigação do cristão fazer.

O texto indica que o diabo possui várias estratégias, não diz explicitamente quais são elas. Sabemos que o objetivo geral de Satanás é afastar as pessoas de Deus, e que o afastamento se dá através da desobediência, então ele poderá usar qualquer método convincente para fazer com que uma pessoa desobedeça a Deus e nem perceba que o fez, assim como ocorreu com Eva. O único modo de identificar essas estratégias e não cair nelas é fazendo o que o texto diz, usando a armadura completa e permanecendo em oração constante. O foco do capítulo não é passar uma lista completa das possíveis táticas do diabo a serem descobertas por nós mesmos, isso é exaustivo. O foco é expor nossa incapacidade de estar de pé por conta própria e a necessidade de nos mantermos submissos a Deus a todo momento, dessa forma estaremos fortes, protegidos e capazes de enxergar as situações corretamente.

Ele ordena por a armadura completa de Deus, pois cada elemento dela representa um ponto específico do evangelho. Se temos um e não temos outro, então não estamos em Deus. Pode alguém ser salvo (capacete) e crer que se salvou pelas obras (couraça)? ou alguém ter como sua base o evangelho (sapato) e viver em mentira (cinto)? por isso a necessidade de vestir toda a armadura. E vestidos de toda a armadura, somos capazes de resistir a Satanás, ao dia mal e permanecermos inabaláveis pois certamente somos nascidos de novo (Efésios 1:13), e como está escrito "Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não peca; mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca". 


O Cinto da Verdade

A descrição da armadura começa com a ordem de cingir-se da verdade. Em uma armadura real, o ato de apertar o cinto, cingir, era realizado antes da batalha para fazer o soldado entrar em postura de prontidão para o combate. Cingir significava se preparar, ativar o estado de alerta, como a Escritura diz muitas vezes "vigiai" ou "estai alerta". 1 Pedro 1:13 usa a expressão "cingir os lombos" como um sinônimo de "estejam preparados". Do mesmo modo, cingir-se da verdade significa, estejam preparados/prontos com a verdade. E de que modo prático isso se dá? Basicamente, estar pronto com a verdade é a conhecer, o que se obtém por meio do Espirito Santo e do estudo das Escrituras. O que é a verdade que o homem pode conhecer e aplicar são as verdades reveladas nas Escrituras. É julgar as circunstâncias com lentes bíblicas. 

Por exemplo: No cenário político atual, há vários problemas, como corrupção, hiper taxações, guerras e tudo mais. Algumas pessoas se desesperam, outras propõem soluções baseadas no próprio entendimento e própria inteligência, outros creem que determinados políticos resolveriam a situação e consertariam totalmente a situação, sem causar nenhum  mal maior para conseguir isso. 
Alguém com o lombo cingido da verdade, não permite que o desespero tome conta de si, pois sabe que há um Deus soberano controlando todas as coisas e que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que o amam, por mais que não consigamos enxergar de que modo. Também não propõe soluções baseadas no próprio entendimento pois sabe que isso impede de confiar naquele que realmente sabe de todas as coisas e nem procura, por meio da própria inteligência, propor soluções, pois sabe que Deus tornou louca a sabedoria desse mundo e a verdadeira sabedoria, para esse mundo, é vista como loucura. Tão pouco crê que algum político poderia trazer a realidade perfeita, pois o Édem foi proibido de ser vivido onde há pecado; nem crê que eles possam causar algum bem sem causar muitos outros maus, e nem que eles sejam puramente bons e bem intencionados com erros acidentais, pois isso é contrário a doutrina da depravação total.

Esse foi um breve exemplo, mas é dessa forma como a verdade, as doutrinas reveladas nas escrituras, são aplicadas de forma prática na minha vida, servindo como as lentes nas quais posso enxergar de forma nítida a realidade que aos meus olhos é completamente embaçada. Não há um guia ou uma checklist para isso. Você não pode esperar ter capacidade de aplicar todas as verdades reveladas pelo próprio entendimento, porque somente o Espírito pode fazer, no momento devido. Enxergar o mundo e as circunstâncias com as lentes certas não vem de um trabalho braçal do ser humano, mas da misericórdia de Deus conceder a quem o busca o Espírito que guia em toda a verdade (João 16:13). Nossa parte consiste em buscar a Deus, expor nossa incapacidade, pedir que nos permita entender as escrituras e sua aplicação e nos dedicarmos a leitura dela todos os dias. O Espírito trará na nossa mente o entendimento correto das circunstâncias, conforme andamos com Ele, pois ele guia nossos passos, nosso entendimento e nos guiará em toda a verdade (Salmo 119:105; Salmo 43:3;  Salmo 25:5; Provérbios 4:11-12). Como falei, não é algo que vem de um esforço braçal do ser humano, mas de um relacionamento dinâmico.


Couraça da justiça

Na armadura, a couraça tinha a função de proteger os órgãos vitais, especialmente o coração. Na bíblia, o termo coração aparece diversas vezes, ele significa mente/pensamentos/intelecto. É preciso lembrar que a armadura é de Deus e não nossa. Ele nos permite colocar a armadura que é dEle. Então a justiça, que é a couraça, é a justiça de Deus e não a nossa. Até porque nós não temos justiça própria (Isaías 64:6, Filipenses 3:9, Salmo 14:2-3). A justiça de Deus que ele nos concede vestir é a justificação pela fé, como vemos em Romanos 3:21-22, 24-26.

Podemos entender que a função da justiça em nós é tanto nos livrar da morte quanto proteger nossa mente. Quando o ataque mortal nos atingir, não morreremos. Pois, por meio da justiça de Deus posta em nós, que é a couraça de Deus em nós, que é a justificação pela fé, nós recebemos a vida eterna. E também como a couraça, a fim de proteger a vida, protege especialmente o coração, a justiça de Deus em nós endireita e protege nossos pensamentos e entendimento que antes eram corrompidos pelo pecado, assim recebemos em nós a mente de Cristo (1 Coríntios 2:16 ).

Aqui é importante enfatizar a depravação total. Não há nada de bom no ser humano, nem nada que ele faz por si mesmo que mereça algo além de condenação. Quando alguém faz algo bom, não é ela que está fazendo, mas a graça (seja comum ou salvífica) através dela, por alguma razão. Fazer um "bem" é mais do que a obrigação do ser humano, nada do que ele pode esperar receber uma recompensa. Do contrário, Cristo diz que após ter feito tudo, o ser humano ainda é um servo inútil (Lucas 17:10). Quanto mais alguém que está muito longe de fazer tudo, que faz menos do que 0,5% de tudo. Deus é tão abundante em graça que concede ao ser humano o perdão das suas milhares de transgressões diárias caso haja arrependimento e ainda o promete recompensas eternas pelo o que o Espírito dEle próprio realizou dentro do ser humano. Essa concepção de si mesmo é a "pobreza de espírito" narrada no sermão da montanha.

Podemos imaginar que os ataques contra a justiça de Deus em nós são os ataques contra a justificação pela fé. Certamente alguma ilusão de justificação por mérito próprio: algo como a ideia de que não pode ser salvo por ter cometido algo, mesmo após ter se arrependido, mudado e pedido perdão; ou de que é salvo por alguma ação que realizou; ou ser cego a ponto de não enxergar pecado em si mesmo; ou ser bom aos próprios olhos e por aí em diante. Lembre-se "A Deus pertence a salvação" não possuímos nenhuma espécie de mérito salvífico, não é por nossas próprias ações que recebemos a vida eterna, mas pela misericórdia de um Deus bom. Deus sabe que somos falhos e está disposto a perdoar tudo aquilo que confessarmos com arrependimento genuíno e intenção de nunca mais praticar. Mais uma vez, a salvação não é por mérito próprio. Outra espécie de ataque contra a couraça poderia ser fazer o ser humano ter a ilusão de bondade própria, ser bom aos próprios olhos (Provérbios 3:7-8). Cristo disse: "Por que me chamas bom? Ninguém é bom, senão um, que é Deus." (Lucas 18:19). Se ele agiu dessa forma, o que devemos fazer? seguir-lhe o exemplo (João 13:15). Para isso, é necessário desprezar toda espécie de bajulação e lisonjeio (Provérbios 29:5; Provérbios 26:28), não deixando que nenhum comentário desse tipo entre em nosso coração nem crie nenhuma raiz, pois não queremos usurpar os méritos do que não é nosso, sabendo que o bem que há em nós não é nosso (Tiago 1:17-19).

Não é incomum pessoas pecarem por pararem de ter Deus como referência por estarem ocupadas olhando para si mesmas e seus méritos. Por exemplo, uma moça cristã se relaciona com um homem que a trai por se considerar indigna de um bom relacionamento bom. Comumente isso é visto entre os céticos como um caso de baixa alto estima. Mas, teologicamente falando, é um caso de estima excessiva de si mesmo. Pois, somente se estimando mais do que estimando as ordens de Deus você ignoraria o que Ele diz para agir de acordo com as suas concepções de si mesmo. Dentro do cristianismo não existe esse tipo de coisa como agir em resposta a sua visão de si mesmo, todas as ações devem ser pautadas em obedecer ao que Deus ordenou, e obviamente ninguém nunca vai merecer o que a Ele ordena, porque "A lei do Senhor é perfeita e restaura a alma; o testemunho do Senhor é fiel e dá sabedoria aos simples." e “todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia”. A obediência não é baseada em mérito próprio, pois esse mérito realmente não existe (salmo 14; 51 e romanos), mas na obrigação de todo homem de obedecer a Deus, pois "teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo homem." (Eclesiastes 12:13)


Sapatos da Preparação do Evangelho da Paz

No império romano, os inimigos costumavam por obstáculos no chão para fazer os soldados caírem e assim serem derrotados. O evangelho vai nos pés pois ele é a nossa base, a base de toda a armadura, guia nossos passos e nos mantém de pé. O evangelho é a boa noticia, a novidade, de salvação, que se dá, de forma resumida, nos seguintes pontos:

  • O ser humano viveu no paraíso, que era o lugar onde a presença de Deus estava presente de forma plena. Ele escolheu ir contra Deus e com isso foi expulso da sua presença e incapaz de retornar, assim nasceu o pecado. Todos os que nasceram após isso nasceram com natureza de pecado. Todos pecamos e estamos destituídos da glória de Deus. Nossa natureza é incapaz de fazer o bem a não ser por intermédio da graça operando em nós, de modo que tudo o que fazemos por nós mesmos é ruim e nossa justiça é como trapo de imundice. (Couraça)
  • Por Deus ser a justiça, todo o mal do ser humano exige uma punição proporcional. O ser humano é incapaz de não fazer o mal, então estava fadado a condenação. Deus, por misericórdia, enviou Cristo, que foi perfeito em tudo, para sofrer a nossa condenação em nosso lugar e dar a oportunidade de nos religarmos a Deus. (Couraça)
  • Por meio da fé, que não é uma ação nossa, mas um dom de Deus, somos justificados. (Escudo)
  • Por essa justificação somos salvos da nossa natureza, pois recebemos o Espírito que nos dá uma nova. E esse Espírito nos vivificará após nossa morte, e nos tornará imortais para vivermos em alegria eterna. (Capacete)
  • Após salvos, o Espírito que passou a habitar em nós nos dá o entendimento da palavra e a capacidade de aplica-la de forma prática em nossa vida. (Espada)

Todas as peças da armadura são partes especificas, isoladas, do que é o fundamento dela, o evangelho. Cada uma tem a função de proteger uma parte específica do crente para o manter dentro da base. Por isso é necessário usar a armadura completa, pois, faltando um pedaço dela, não somos cristãos. Todo raciocínio deve ser construído sobre a base do evangelho, não de outra coisa se não ele ou de um evangelho que seja falso em algum ponto. Algo que não seja construído nessa base, cedo ou tarde trará frutos ruins. Para estar firme para resistir ao dia mal é fundamental estar construído sobre a rocha. Devemos estar sempre prontos com a boa notícia de que hoje o ser humano pode ter paz com Deus, essa é a preparação do evangelho da paz. 


O Escudo da Fé

O escudo é a parte mais importante da armadura, pois o texto diz "embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno." Cada parte da armadura serve para impedir um ataque localizado ao um ponto específico, porém, com o escudo pode-se apagar a todos. E sem o escudo, não se poderia apagar nenhum, pois, sem a fé é impossível permanecer em Deus e com isso seriamos do inimigo. Então, de todas as peças, essa certamente é a principal. 
A função do escudo é proteger todo o corpo, em todas as direções, e é isso que a fé faz conosco, nos mantém em segurança. Mas é necessário esclarecer o que é essa fé. Não é simplesmente uma crença, fé "é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem." (Hebreus 11:1). Muitas pessoas dizem ter fé, quantas realmente a tem? O que revela se há fé ou não, não são as coisas que as pessoas dizem, mas a postura como se comportam diante as circunstâncias. Por que ninguém que crê realmente em uma coisa, age de forma oposta do que acredita. É por meio de nossas ações e reações as circunstâncias, que se manifesta no que realmente cremos. "convicção de fatos que não se veem" implica que o que está revelado na Escritura é o que a pessoa crê, não o que as circunstâncias da vida revelam, ou o que aparenta ser. É muito comum ver pessoas com as mentes cheias de crenças que são o oposto do que a Escritura diz, pois se fundamentam no que é popularmente aceito, não realmente nos fatos que não se veem. 

De forma prática, a fé deve se manuseada da mesma forma a qual um escudo o é, sendo direcionado especificamente para a direção de onde o dado inflamado vem. A função do dado inflamado é causar ferimento, e o que a fé faz é impedir ele o atinja. Se a fé é a confiança, o que ela vai combater é insegurança, desconfiança e medo. A confiança é o que capacita o homem para a obediência em tudo o que Deus mandou, pois, ninguém pratica o que não crê (Romanos 1:5; Hebreus 11). Quando você está pronto a obedecer, certamente Satanás enviará um capanga para lançar sementes de descrença tanto nas suas crenças quanto nas suas obras derivadas das crenças, assim como Sambalate e Tobias fizeram com Neemias para o impedir de executar o que Deus o havia ordenado. Devemos crer e fazer apenas o que Deus diz, não no raciocínio de terceiros ou em probabilidades. Basicamente, é assim que se manipula a fé como um escudo, estando firme em tudo o que Deus diz e ignorando todas as sugestões que ponham em prova o que ele diz, pelo motivo que for. É procurar identificar com clareza o que está sendo sugerido, ver como aquilo se relaciona com o que Deus revelou e decidir se prefere dar ouvidos ao raciocínio humano, aos próprios desejos (carne), a Satanás ou a Deus.


O Capacete da Salvação

O capacete tem a função de proteger a cabeça, que é um dos órgãos vitais. Se o inimigo conseguir acertar a cabeça do adversário, seu adversário morre e o inimigo ganha a guerra. Isso significa que a salvação é o que nos mantém vivos, mesmo após a morte física. Ele é necessário para que se possa encarar o adversário de cabeça erguida e seguir em frente sem medo dos ataques. Para que a mente esteja protegida dos ataques, é necessário ter a esperança da salvação. 

Todo ser humano nascido após a queda tem o desejo de algo que o supra interiormente, pois temos saudade da plenitude do Édem, onde nossos pais viveram com Deus, por isso hoje estamos naturalmente vazios. O que nos tirou desse lugar foi o pecado, que é a transgressão da lei. Pois, somente estando unido ao bem pleno, teremos plenitude em nós. Fazer o oposto do que o bem manda é praticar o mal, e qualquer tipo de mal gera o afastamento do bem, de forma que, para se unir novamente, seria preciso jamais ter feito o mal, o que um ser humano não pode fazer. A salvação do homem é ter seus pecados apagados, para poder retornar a esse estado de plenitude interior, de viver no paraíso. É isso que Cristo veio fazer, nos dar a oportunidade de reconciliarmos com Deus.

Todo ser humano tem o instinto de adorar a algo que pensa ser o que o salva. As pessoas carnais buscam sua salvação nas circunstâncias, especialmente naquilo que as falta, se faltar dinheiro, a expectativa de salvação estará no dinheiro, se faltar relacionamento, a expectativa estará no relacionamento e por aí em diante. Pois, como a mente carnal só entende o que é desse mundo, ela tem a expectativa de conseguir viver o paraíso na terra, e se esforça para isso. Se alguém não estiver adorando ao Deus verdadeiro, certamente está adorando a algum deus falso, mas sempre, invariavelmente estará adorando algo que crer que irá trazer o seu bem. O cristão é aquele que deposita sua confiança em Deus e espera sua salvação nEle. Ele crê que seu coração será suprido e plenamente satisfeito quando estiver com Deus de forma plena, e aguarda por esse momento. 

Ter a mente na eternidade desse modo é o que torna alguém capaz de vencer os ataques contra sua mente. Pois satanás tentará o levar a desobediência através de tentações de coisas que supostamente o salvariam, isso é, o devolveriam ao Édem que ele anseia no seu interior. Estar vestido do capacete da salvação é aguardar que essa salvação, esse retorno ao Édem de alegria e satisfação sem fim, venham como Deus prometeu que viriam, por meio da vida ao lado dele, não por nenhum outro meio.

O pecado confundiu a mente do ser humano, trouxe engano e futilidade. A salvação traz ao ser humano a renovação da mente, e essa renovação é o que torna o cristão imune aos ataques de Satanás. Anteriormente, na mesma carta, o apóstolo diz: "E vos renoveis no espírito da vossa mente" (Efésios 4:23.), que faz referência a Romanos 12:1-2: "Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito."


A Espada do Espírito, a Palavra

Todas as peças vistas anteriormente tinham a função de defesa, essa é a única que tem a função de ataque. A palavra é a espada, pois é com ela que o inimigo é ferido, como podemos ver na tentação de Jesus no deserto. Ele respondeu a cada tentação citando um versículo que a contradizia. Devemos fazer o mesmo em nossas vidas: acredita apenas no que está revelado e quando vier uma sugestão oposta, a repreender citando as Escrituras. Para isso é necessário ter o domínio dela, lendo-a todos os dias e pedindo por entendimento e capacidade de a usar com sabedoria. 

A espada é do Espírito, isso mostra que quem fere e ataca o inimigo é o Espírito, e ele faz isso através da palavra. Saber isso refuta a ideia popular, de origem medieval, de que o ser humano trava uma briga com os espíritos malignos e que ele tem autoridade para repreender espíritos, sendo que quando o anjo foi batalhar com um espírito maligno ele disse: "Que o Senhor te repreenda", e o espírito saiu imediatamente. Pois, somente o Senhor tem poder de repreender o que é que seja, e quando o Senhor repreende, o mal é obrigado a ir. Muitos, por não compreenderem a soberania de Deus, tem essa mentalidade medieval de que há entre Deus e Satanás uma batalha entre iguais e que cabe ao ser humano fazer ritos para ajudar a Deus vencer essa batalha, o que não poderia ser o mais oposto do que a Escritura ensina. Ao invés de se preocuparem com misticismos fundamentados em tradições humanas, deveriam se preocupar em viver em obediência a Palavra, mesmo quando o que ela ordena é desconfortável por ser contrário as inclinações da carne, essa é a luta realmente eficiente contra os demônios.

Os relatos de exorcismos católicos foram uma das piores coisas que li na minha vida inteira até então, conseguem ser piores do que algumas das palhaçadas e escárnios por falta de conhecimento bíblico e de bom senso que tenho consciência que ocorrem nos meios carismáticos. Pretendo trazer algum artigo sobre o tema em breve. 

O apóstolo encerra o capítulo ensinando que devemos, após ter posto toda a panóplia, permanecer no Senhor com oração e suplicas por todos os santos e pede oração por ele próprio, para que ele possa fazer o que é necessário. Se Paulo dependia da oração dos santos para conseguir fazer o que deveria, quanto mais nós precisamos, orar sempre por nós e pelos outros.

"Portanto, submetam-se a Deus. Resistam ao diabo, e ele fugirá de vocês."
Tiago 4:7


"Responde-me quando clamo, ó Deus que me fazes justiça! Dá-me alívio da minha angústia; tem misericórdia de mim e ouve a minha oração. Até quando vocês, ó poderosos, ultrajarão a minha honra? Até quando estarão amando ilusões e buscando mentiras?"

Davi está sentindo angustia, possivelmente ansiedade, antes de dormir, algo muito comum até nos dias de hoje. Estava angustiado por que pessoas más, com mais poder do que ele, estavam planejando o seu mal. Mas foi guiado a como reverter sua circunstância interior e passou as instruções do que fazer nessa situação.


"Saibam que o Senhor escolheu o piedoso; o Senhor ouvirá quando eu o invocar. Na vossa ira, não pequeis; consultai o coração no travesseiro e aquietai-vos. Oferecei sacrifícios de justiça e confiai no Senhor."

Ele passa a instrução de trazer a consciência que Deus ouve os justos e cuida deles. Ele manda que examinemos nossos corações, isso é, examinemos nossa consciência. A única preocupação digna de um cristão é se ele cometeu alguma ofensa contra Deus ou não, pois, se ele cometeu, Deus não o ouvirá e ele não terá quem o ajude, mas se ele está em paz com Deus, então certamente Ele cuidará de todo o resto. Caso haja algo mal no coração, ofereça sacrifícios de justiça, nos dias de hoje isso significa pedir perdão. Pois, estando limpos e com a consciência tranquila poderemos estar em paz com Deus e com a confiança de que Ele cuidará de tudo o que nos angustia.  


"Muitos perguntam: "Quem nos fará desfrutar o bem?" Faze, ó Senhor, resplandecer sobre nós a luz do teu rosto!"

O bem deixou de ser desfrutado quando o homem, por sua desobediência, perdeu a presença do seu Criador que é a fonte de todo o bem. Nessa mudança da condição humana a necessidade por um bem constante permaneceu em seu interior, mas ele confunde os meios pelo qual o bem se manifesta com a origem do bem e tenta o obter pelos meios, que em si mesmas são coisas inconstantes, passageiras, circunstanciais, que geram um bem breve e passageiro por serem reflexos, sombras, de um bem eterno (Jeremias 2:13; Eclesiastes 3:11; Oséias 2:8; Tiago 1:17; Romanos 1:25; Isaías 55:1-2; João 4:13-14). Mas, por meio do sacrifício de justiça, o homem justificado pode voltar a desfrutar o bem que seu inconsciente sente saudade, desfrutará desse bem de forma plena na eternidade que se inicia após sua morte, enquanto desfruta em parte nessa vida, conforme se aproxima do bem pleno que preenche seu coração (1 coríntios 13:9-10;12). Se invocarmos a Deus e ele se apresentar a nós, a luz do seu rosto revelará nossa escuridão, assim saberemos o que é o bem, e então o mal dentro de nós será manifesto. Desse modo nossa consciência é duramente pesada, saberemos por o que pedir perdão, pediremos e seremos reconciliados. Quanto mais longe estamos de Deus, mais corretos somos aos nossos olhos, pois dado a nossa cegueira de nós mesmos, temos nosso próprio entendimento como padrão de moralidade, nossas referências são os erros dos outros, que a nossos olhos, naturalmente incapazes de ver mal em nós mesmos (Provérbios 16:2), parecem piores do que os nossos e essa percepção eleva nosso conceito de nós mesmos, como bem ilustrado na parábola do fariseu e do publicano. Mas, quanto mais nos aproximamos do Criador, mais sua luz ilumina nossas trevas e revela nossas sujeiras mais profundas, que antes éramos incapazes de perceber. É um paradoxo de que quanto mais nos elevamos, mais baixos nos enxergamos, e quanto mais baixo estamos, mais elevados nos vemos. Quanto mais próximos da perfeição plena, mais perfeitos nos tornamos e mais imundos nos sentimos, pois quanto mais próximos, mais somos humilhados, e essa humilhação é que nos transforma em algo melhor (Salmo 51:17).


"Encheste o meu coração de alegria, alegria maior do que a daqueles que têm fartura de trigo e de vinho."

No início do salmo, Davi estava aflito, mas ao invocar o Senhor, se reconciliar com Ele e ver sua face revelada, em pouco tempo ele se sentiu cheio de alegria. De alegria maior do que a de quem o causou angustia, pois sua alegria não é construída sobre a areia, não é baseada em circunstâncias externas. 

A fartura de trigo e vinho é um símbolo do luxo e conforto. Nos dias de hoje seria algo como ter muito de tudo e não precisar mais trabalhar por nada, apenas usufruir de tudo sem restrições. Basicamente, aquela vida que as pessoas do Instagram aparentam ter. Mas o que enche o corpo, não enche o Espírito. Um mendigo próximo de Deus se sente mais preenchido do que um trilionário que não nunca sentiu Deus. Pois esse tem tudo de tudo o que não é capaz de satisfaz o interior, e de que adianta tudo isso?


"Em paz me deito e logo adormeço, pois só tu, Senhor, me fazes viver em segurança."

Após estar alegre no senhor, Davi finaliza o relato dizendo que em paz se deita. Por meio da revelação da luz do rosto de Deus, e a reconciliação com Ele, a angústia profunda de Davi foi transformada em alegria e em alguns minutos depois, a alegria deu lugar a plena paz em seu coração. Como disse o amigo de Jó: “Reconcilia-te, pois, com ele e tem paz, e assim te sobrevirá o bem.” Jó 22:21.

Resumindo de forma prática, é importante saber que temos etapas claras a seguir quando a aflição toma conta de nós, etapas que podem ser feitas diariamente, antes de dormir. Que são: invocar a presença do Senhor; examinar nossa consciência para ver se há algum mal; expor a Deus nossa transgressão; expor nossas aflições, desfrutar da sua presença e então ir dormir em paz sabendo que Deus ouve os justos e eu estou justificado. Deus, com certeza, ouviu quando o contei as minhas aflições e certamente cuidará de tudo. Não sou eu quem soluciono as circunstâncias, é o Senhor, e ele está cuidando de mim. 

"Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus; sou exaltado entre as nações, sou exaltado na terra. O SENHOR dos Exércitos está conosco; o Deus de Jacó é o nosso refúgio." Salmo 46:10-11.


Faz, ó SENHOR, resplandecer sobre nós a luz do teu rosto!




Eu fiquei quase passando mal de ódio por conta de uma coisa ridícula e injusta que soube que aconteceu. Ver a notícia que uma pessoa relacionada com abuso de crianças assumiu um cargo importante, onde pode gerar muito prejuízo, me deixou muito chateada. A chateação é natural, mas devemos cuidar para não questionarmos a justiça de Deus e acabarmos caindo em indagação e desconfiança. É um equilíbrio difícil, pois há os que sintam ódio do mal e com isso questionem a justiça de Deus (como vemos na história de Jó); e os que dizem confiar na justiça de Deus para justificar a sua indiferença a prática do mal. 
Bem, mas então, porque Deus não joga um raio na cabeça desse homem desgraçado?
Essa pergunta é respondida na parábola do joio e do trigo. Jesus disse que se o joio fosse ceifado antes da colheita, o trigo poderia ser arrancado junto, e ele não deseja isso. 
Isso significa que a justiça de Deus exige a punição completa pela transgressão. Toda transgressão, por mais que aos nossos olhos seja pequena, diante de Deus é digna de morte. Então, se Deus decidisse fazer justiça nessa terra antes do tempo determinado, todos os seres humanos seriam fulminados. Não haveria chance de arrependimento, nem ninguém seria salvo. Então, por amor aos salvos, Deus decidiu adiar o julgamento até que todos aqueles que ele sabe que se salvaram tenham tempo para se salvar. 
Como disse o profeta:
"Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis."
Lamentações 3:22



O dinheiro é a ferramenta que o mundo usa para realizar trocas. Assim como todas as coisas, toda riqueza vem de Deus, seja de forma direta ou indireta. Segundo a justiça dEle, cada um recebe conforme a capacidade que possui para administrar (Mateus 25:14-30). De acordo com as Escrituras, tudo o que chega a nossas mãos pertence a Deus (Deuteronômio‬ ‭8:17‭-‬18‬), Ele nos concede administrar temporariamente e espera que façamos bom uso (Lucas 16:11). Cada centavo que chega até nós é como uma semente dada por Deus, ele espera que a plantemos em um bom terreno para que produza bons frutos (Mateus 25:14-30). O dinheiro é importante, pois é uma das ferramentas para cumprir os propósitos de Deus e o que a Bíblia nos ordena, pois somos ordenados a levar o evangelho a nações remotas e vestir e alimentar os pobres e a multiplicar nossos talentos (talento era o nome da moeda na época da parábola), além dos chamados de vocação individual. Tudo isso requer dinheiro.

Alguns usam da prerrogativa que o cristianismo prega a aceitação do sofrimento e proíbe a prática da cobiça como uma justificativa para sua conduta preguiçosa e indiferença. O cristão deve aceitar ter o que Deus o determinar ter, pobreza ou riqueza, mas isso não quer dizer que ele não esteja sob a obrigação de trabalhar de forma árdua e dedicada, buscando as melhores oportunidades para poder ajudar mais aos outros, seja com sua influência ou dinheiro. Também é obrigado a prestar contas de tudo o que foi posto em sua mão, o que inclui o tempo. Os adoradores do próprio prazer não acreditam haver nada demais em jogar no lixo o tempo com as coisas que lhes agradam, ao invés de agir de forma digna e se dedicarem ao trabalho.  E, ao final, acabam pobres, mas não culpam sua inércia, preguiça, idolatria ao próprio prazer e egoísmo como causadores da sua pobreza, mas sim enxergam-na como uma cruz que faz parte da vida do cristão (Provérbios 13:23). Esses, ao se apegar à prerrogativa do sofrimento do cristão, não enxergam a hipocrisia que há no que dizem, pois, nesse caso, são pobres apenas por apego ao próprio prazer, não por virtude de suportar as circunstâncias negativas. Pois, se tivessem realmente essa disposição contra a tentação do hedonismo, não sofreriam as consequências da prática dele, nem precisariam inverter os papéis para justificar sua circunstância. Nesse sentido, muitos também confundem e invertem o que é ser servo do dinheiro. Muitos julgam que quem trabalha muito é um escravo do dinheiro, pois pressupõem que o que faz alguém fazer ou deixar de fazer algo é o dinheiro, mas não temos como pressupor as motivações de ninguém, pois só Deus olha o coração.

A servidão do dinheiro é quando é ele que determina o que você faz ou deixa de fazer. É confiar que a solução vem dele. É ser incapaz de dominá-lo, sendo assim dominado, servo dele. Se todo o seu tempo de vida é gasto atrás do dinheiro, você é um escravo do dinheiro. A falta de sabedoria para administrar o dinheiro pode te tornar um servo dele, fazer com que ele administre a sua vida (o que faz dela, como gasta seu tempo, etc.). Fui muito tentada a me curvar a Mamom quando estava na fase de escolher o curso da faculdade. Muitos tentam te pressionar a escolher estudar aquilo que você não tem vocação nem propósito, apenas para receber o máximo de dinheiro que se pode, como se o tempo de vida gasto em correr atrás do dinheiro puramente para acumulá-lo não fosse um preço muito caro. Tentam pôr medo em ti, como se fosse por meio de um emprego ou do esforço próprio que se alcance a segurança e sustento necessário, o que é contrário às Escrituras. Na Bíblia, vemos claramente que nosso trabalho é o principal dos meios que Deus usa para nos trazer o sustento, mas o que traz não é o trabalho em si, mas a provisão de Deus através dele, e Deus promete nos sustentar naquilo que nos mandar fazer e não que nos preocupemos com o dinheiro e bens.

A forma correta de lidar com o dinheiro é a mesma de lidar com todas as outras áreas da vida, aplicando os ensinamentos bíblicos. O principal desses ensinamentos foi o que comentei aqui, de administrá-lo como um bom mordomo, sabendo que ele não é seu, mas um instrumento que Deus pôs em suas mãos. E também que ele é meramente um instrumento, um meio para coisas, não um fim em si mesmo; por isso não deve ser buscado, nem deve-se depositar confiança alguma nele, pois esses dois últimos nós devemos praticar apenas a Deus, do contrário seria idolatria e amor ao dinheiro. Há diversos outros ensinamentos bíblicos sobre a administração do dinheiro e bens, principalmente em Provérbios e Eclesiastes, mas seria necessário um post só para isso.


Os Desânimos do Ministro, palestra VI para ministros.

Assim como está registrado que Davi, no calor da batalha, ficou exausto, assim também pode ser escrito a respeito de todos os servos do Senhor. Crises de depressão atingem a maioria de nós. Por mais alegres que sejamos, de vez em quando nos sentimos abatidos. Os fortes nem sempre são vigorosos, os sábios nem sempre estão prontos, os bravos nem sempre são corajosos e os alegres nem sempre são felizes. Pode haver aqui e ali homens de ferro, a quem o desgaste não causa nenhum prejuízo perceptível, mas certamente a ferrugem os desgasta; e quanto aos homens comuns, o Senhor sabe, e os faz saber, que são apenas pó. Sabendo, por experiência dolorosa, o que significa profunda depressão de espírito, sendo visitado por ela em períodos não raros ou espaçados, pensei que seria consolador para alguns dos meus irmãos se eu expressasse meus pensamentos sobre isso, para que os homens mais jovens não imaginassem que algo estranho lhes tivesse acontecido quando se tornaram, por um tempo, possuídos pela melancolia; e para que os homens mais tristes soubessem que aquele sobre quem o sol brilhou alegremente nem sempre andou na luz.

Não é necessário, por meio de citações de biografias de ministros eminentes, provar que períodos de terrível prostração se abateram sobre a maioria, senão sobre todos. A vida de Lutero poderia bastar para dar mil exemplos, e ele não era de forma alguma dos mais fracos. Seu grande espírito estava frequentemente no sétimo céu da exultação e, com igual frequência, à beira do desespero. Seu próprio leito de morte não estava livre de tempestades, e ele soluçou até o último sono como uma criança grande e cansada. Em vez de multiplicar os casos, detenhamo-nos nas razões pelas quais essas coisas são permitidas; por que os filhos da luz às vezes caminham na escuridão espessa; por que os arautos da aurora se encontram às vezes em dez vezes mais noite.

Não é antes de tudo que são homens? Sendo homens, estão cercados de enfermidades e herdeiros de sofrimentos. Bem disse o sábio nos Apócrifos, Eclesiastes 4:1, 2, 3, 4, 5-8: "Grandes dores são criadas para todos os homens, e um jugo pesado sobre os filhos de Adão, desde o dia em que saem do ventre de sua mãe até o dia em que retornam à mãe de todas as coisas — a saber, seus pensamentos e o medo de seus corações, e sua imaginação das coisas pelas quais lamentam, e o dia da morte. Desde aquele que se assenta no trono glorioso, até aquele que se assenta abaixo, na terra e nas cinzas; desde aquele que está vestido de seda azul e usa uma coroa, até aquele que está vestido de linho puro — ira, inveja, angústia e inquietação, e medo da morte e rigor, e tais coisas vêm tanto ao homem quanto ao animal, mas sete vezes mais aos ímpios." A graça nos protege de muitas dessas coisas, mas, por não termos mais graça, ainda sofremos até mesmo com males evitáveis. Mesmo sob a economia da redenção, é muito claro que devemos suportar enfermidades; caso contrário, não haveria necessidade do Espírito prometido para nos ajudar nelas. É necessário que às vezes estejamos aflitos. Homens bons recebem a promessa de tribulação neste mundo, e ministros podem esperar uma parte maior do que outros, para que aprendam a simpatizar com o povo sofredor do Senhor e, assim, possam ser pastores adequados de um rebanho enfermo. Espíritos desencarnados poderiam ter sido enviados para proclamar a palavra, mas não poderiam ter compreendido os sentimentos daqueles que, estando neste corpo, gemem, estando sobrecarregados; anjos poderiam ter sido ordenados evangelistas, mas seus atributos celestiais os teriam desqualificado de ter compaixão pelos ignorantes; homens de mármore poderiam ter sido moldados, mas suas naturezas impassíveis teriam sido um sarcasmo sobre nossa fragilidade e uma zombaria de nossas necessidades. Homens, e homens sujeitos às paixões humanas, o Deus onisciente escolheu para serem seus vasos de graça; daí essas lágrimas, daí essas perplexidades e abatimentos.

Além disso, a maioria de nós é, de uma forma ou de outra, fisicamente insalubre. Aqui e ali, encontramos um velho que não se lembra de ter ficado afastado por um dia; mas a grande maioria de nós sofre de alguma forma de enfermidade, seja física ou mental. Certas doenças corporais, especialmente aquelas relacionadas aos órgãos digestivos, ao fígado e ao baço, são fontes frutíferas de desânimo; e, por mais que um homem se esforce contra sua influência, haverá horas e circunstâncias em que elas o vencerão por um tempo. Quanto às doenças mentais, existe algum homem completamente são? Não estamos todos um pouco desequilibrados? Algumas mentes parecem ter um tom sombrio essencial à sua própria individualidade; delas, pode-se dizer: "A melancolia as marcou como suas"; mentes refinadas, além disso, e regidas pelos princípios mais nobres, mas ainda assim mais propensas a esquecer o lado bom e a se lembrar apenas da escuridão. Tais homens podem cantar com o velho poeta:

"Nossos corações estão partidos, nossas harpas estão sem cordas,
Nossos únicos suspiros e gemidos musicais,
Nossas canções são ao som de lacrimas ,
Estamos todos muito preocupados."
THOMAS WASHBOURNE.

Essas enfermidades podem não prejudicar a carreira de utilidade especial de um homem; podem até ter sido impostas a ele pela sabedoria divina como qualificações necessárias para seu peculiar curso de serviço. Algumas plantas devem suas qualidades medicinais ao pântano em que crescem; outras, às sombras em que florescem. Há frutos preciosos produzidos pela lua, bem como pelo sol. Barcos precisam de lastro, assim como velas; um arrasto na roda da carruagem não é obstáculo quando a estrada desce. A dor provavelmente, em alguns casos, desenvolveu o gênio; caçando a alma que, de outra forma, poderia ter dormido como um leão em sua cova. Não fosse pela asa quebrada, alguns poderiam ter se perdido nas nuvens, alguns até mesmo daquelas pombas escolhidas que agora carregam o ramo de oliveira em suas bocas e mostram o caminho para a arca. Mas onde no corpo e na mente há causas predisponentes à depressão de espírito, não é de admirar que em momentos sombrios o coração sucumba a elas; O espantoso em muitos casos é — e se vidas interiores pudessem ser escritas, os homens o veriam assim — como alguns ministros continuam trabalhando e ainda exibem um sorriso no rosto. A graça ainda tem seus triunfos, e a paciência tem seus mártires; mártires que, no entanto, devem ser honrados porque as chamas ardem em seus espíritos e não em seus corpos, e seu ardor é invisível aos olhos humanos. Os ministérios de Jeremias são tão aceitáveis ​​quanto os de Isaías, e até mesmo o taciturno Jonas é um verdadeiro profeta do Senhor, como Nínive bem o sentiu. Não desprezeis os coxos, pois está escrito que eles capturam a presa; mas honrai aqueles que, estando cansados, ainda perseguem. A meiga Lia foi mais fecunda que a bela Raquel, e as dores de Ana foram mais divinas que as jactâncias de Penina. "Bem-aventurados os que choram", disse o Homem das Dores, e que ninguém os considere de outra forma quando suas lágrimas forem temperadas com graça. Temos o tesouro do evangelho em vasos de barro, e se houver uma falha aqui e ali no vaso, que ninguém se surpreenda.

Nosso trabalho, quando empreendido com seriedade, nos expõe a ataques que nos levam à depressão. Quem pode suportar o peso das almas sem, às vezes, afundar no pó? Anseios apaixonados pela conversão dos homens, se não plenamente satisfeitos (e quando o são?), consomem a alma com ansiedade e decepção. Ver os esperançosos se desviarem, os piedosos esfriarem, os professos abusarem de seus privilégios e os pecadores se tornarem mais ousados ​​no pecado — não bastam essas visões para nos esmagar por terra? O reino não vem como gostaríamos, o nome reverendo não é santificado como desejamos, e por isso devemos chorar. Como podemos deixar de estar tristes, enquanto os homens não creem em nossa pregação e o braço divino não se revela? Todo trabalho mental tende a cansar e a deprimir, pois muito estudo é um cansaço da carne; mas o nosso é mais do que trabalho mental — é trabalho do coração, o labor da nossa alma mais íntima. Quantas vezes, nas noites do Domingo, sentimos como se a vida tivesse sido completamente lavada de nós! Depois de derramarmos nossas almas sobre nossas congregações, sentimo-nos como jarros de barro vazios que uma criança poderia quebrar. Provavelmente, se fôssemos mais como Paulo e zelássemos pelas almas com mais nobreza, saberíamos mais sobre o que é ser consumido pelo zelo da casa do Senhor. É nosso dever e privilégio exaurir nossas vidas por Jesus. Não devemos ser espécimes vivos de homens em perfeita preservação, mas sacrifícios vivos, cujo destino é ser consumido; devemos gastar e ser gastos, não nos entregarmos a lavanda e nutrir nossa carne. Aflições como as de um ministro fiel trarão períodos ocasionais de exaustão, quando o coração e a carne falharão. As mãos de Moisés pesaram na intercessão, e Paulo clamou: "Quem é suficiente para estas coisas?" Acredita-se que até mesmo João Batista teve seus desmaios, e os apóstolos certa vez ficaram atônitos e com muito medo.

Nossa posição na igreja também conduzirá a isso. Um ministro plenamente equipado para sua obra geralmente será um espírito isolado, acima, além e à parte dos outros. O mais amoroso dentre seu povo não consegue penetrar em seus pensamentos, preocupações e tentações peculiares. Nas fileiras, os homens caminham ombro a ombro, com muitos camaradas, mas à medida que o oficial sobe de patente, homens de sua posição diminuem em número. Há muitos soldados, poucos capitães, menos coronéis, mas apenas um comandante-em-chefe. Assim, em nossas igrejas, o homem que o Senhor levanta como líder torna-se, no mesmo grau em que é um homem superior, um homem solitário. Os topos das montanhas permanecem solenemente separados e falam apenas com Deus enquanto Ele visita suas terríveis solidões. Homens de Deus que se elevam acima de seus semelhantes em comunhão mais próxima com as coisas celestiais, em seus momentos de fraqueza sentem a falta de simpatia humana. Como seu Senhor no Getsêmani, eles buscam em vão conforto nos discípulos que dormem ao seu redor; Eles ficam chocados com a apatia de seu pequeno grupo de irmãos e retornam à sua agonia secreta com o fardo mais pesado que os pressiona, porque encontraram seus companheiros mais queridos dormindo. Ninguém conhece, a não ser aquele que a suportou, a solidão de uma alma que superou seus companheiros em zelo pelo Senhor dos Exércitos: ela não ousa se revelar, para que os homens não a considerem louca; ela não pode se esconder, pois um fogo queima em seus ossos: somente diante do Senhor ela encontra descanso. O envio de nossos discípulos aos dois e dois por nosso Senhor manifestou que ele sabia o que havia nos homens; mas para um homem como Paulo, parece-me que nenhuma auxiliadora foi encontrada; Barnabé, Silas ou Lucas eram colinas baixas demais para manter uma conversa alta com um cume do Himalaia como o apóstolo dos gentios. Essa solidão, que, se não me engano, é sentida por muitos dos meus irmãos, é uma fonte fértil de depressão; e as reuniões fraternais de nossos ministros e o cultivo de relações santas com mentes afins, com a bênção de Deus, nos ajudarão grandemente a escapar da armadilha.

Não há dúvida de que hábitos sedentários tendem a criar desânimo em algumas constituições. Burton, em sua Anatomia da Melancolia, tem um capítulo dedicado a essa causa da tristeza; e, citando um dos inúmeros autores a quem ele atribui sua contribuição, ele diz: "Os estudantes são negligentes com seus corpos. Outros homens cuidam de suas ferramentas; um pintor lavará seus lápis; um ferreiro cuidará de seu martelo, bigorna, forja; um lavrador consertará seus arados e afiará seu machado se estiver cego; um falcoeiro ou caçador terá um cuidado especial com seus gaviões, cães de caça, cavalos, cães, etc.; um músico encordoará e descordoará seu alaúde; somente os estudiosos negligenciam aquele instrumento (seu cérebro e espírito, quero dizer) que usam diariamente. Bem disse Lucano: 'Cuidado para não torcer a corda com tanta força que ela se rompa.'" Ficar sentado por muito tempo em uma postura, debruçado sobre um livro ou escrevendo uma pena, é em si um desgaste da natureza; mas adicione a isso uma câmara mal ventilada, um corpo que está há muito tempo sem exercício muscular e um coração sobrecarregado com muitas preocupações, e temos todos os elementos para preparar um caldeirão fervente de desespero, especialmente nos meses escuros de neblina:

"Quando um cobertor envolve o dia,
Quando a floresta podre goteja,
E a folha é estampada em argila."
Por mais alegre que um homem seja naturalmente como um pássaro, dificilmente conseguirá suportar ano após ano tal processo suicida; fará de seu estudo uma prisão e de seus livros os guardas de uma cadeia, enquanto a natureza jaz do lado de fora de sua janela, chamando-o à saúde e acenando-lhe para a alegria. Aquele que esquece o zumbido das abelhas entre as urzes, o arrulhar dos pombos-torcazes na floresta, o canto dos pássaros na mata, o murmúrio dos riachos entre os juncos e o suspiro do vento entre os pinheiros, não precisa se surpreender se seu coração se esquecer de cantar e sua alma se tornar pesada. Um dia respirando ar fresco nas colinas, ou algumas horas de caminhada na calma sombria das florestas de faias, varreriam as teias de aranha do cérebro de dezenas de nossos labutantes ministros que agora estão apenas meio vivos. Uma lufada de ar marinho ou uma caminhada brusca contra o vento não dariam graça à alma, mas forneceriam oxigênio ao corpo, que é o segundo melhor.

"O coração está mais pesado no ar pesado,
Todo vento que sopra leva embora o desespero."
As samambaias e os coelhos, os riachos e as trutas, os abetos e os esquilos, as prímulas e as violetas, o terreiro, o feno recém-ceifa e o lúpulo perfumado — estes são o melhor remédio para os hipocondríacos, os tônicos mais seguros para os debilitados, os melhores refrescos para os cansados. Por falta de oportunidade ou de inclinação, esses grandes remédios são negligenciados, e o estudante se torna uma vítima autoimolada.

Os momentos mais favoráveis ​​a crises de depressão, até onde já experimentei, podem ser resumidos em um breve catálogo. Primeiro, devo mencionar a hora do grande sucesso. Quando finalmente um desejo há muito acalentado é realizado, quando Deus é grandemente glorificado por nossos meios e um grande triunfo é alcançado, então somos propensos a desmaiar. Pode-se imaginar que, em meio a favores especiais, nossa alma se elevaria a alturas de êxtase e se regozijaria com alegria indizível, mas geralmente ocorre o contrário. O Senhor raramente expõe Seus guerreiros aos perigos da exultação pela vitória; ele sabe que poucos deles podem suportar tal teste e, portanto, derrama seu cálice com amargura. Veja Elias depois que o fogo caiu do céu, depois que os sacerdotes de Baal foram massacrados e a chuva inundou a terra árida! Para ele, nada de notas musicais autocomplacentes, nada de pavonear-se como um conquistador em vestes de triunfo; Ele foge de Jezabel e, sentindo a repulsa de sua intensa excitação, reza para que possa morrer. Aquele que jamais verá a morte anseia pelo descanso da sepultura, assim como César, o monarca do mundo, em seus momentos de dor, chorou como uma menina doente. A pobre natureza humana não pode suportar tais tensões que os triunfos celestiais lhe trazem; deve haver uma reação. O excesso de alegria ou excitação deve ser pago por depressões subsequentes. Enquanto dura a provação, a força é igual à emergência; mas quando ela termina, a fraqueza natural reivindica o direito de se mostrar. Secretamente sustentado, Jacó pode lutar a noite toda, mas deve mancar pela manhã, quando a luta termina, para não se gabar além da medida. Paulo pode ser arrebatado ao terceiro céu e ouvir coisas indizíveis, mas um espinho na carne, um mensageiro de Satanás para esbofeteá-lo, deve ser a consequência inevitável. Os homens não podem suportar a felicidade pura; Mesmo os homens bons ainda não estão aptos a ter "as frontes cingidas de louro e murta" sem suportar a humilhação secreta para mantê-las em seu devido lugar. Arrebatados por um reavivamento, alçados ao alto pela popularidade, exaltados pelo sucesso em ganhar almas, seríamos como a palha que o vento espalha, se a graciosa disciplina da misericórdia não quebrasse os navios da nossa vã glória com um forte vento oriental e nos lançasse naufragados, nus e desamparados, sobre a Rocha Eterna.

Antes de qualquer grande conquista , um pouco da mesma depressão é muito comum. Ao contemplar as dificuldades diante de nós, nossos corações afundam. Os filhos de Anaque espreitam diante de nós, e somos como gafanhotos aos nossos próprios olhos em sua presença. As cidades de Canaã estão muradas até o céu, e quem somos nós para esperarmos capturá-las? Estamos prontos para largar nossas armas e fugir. Nínive é uma grande cidade, e fugiríamos para Társis antes de encontrar suas multidões barulhentas. Já procuramos um navio que possa nos levar silenciosamente para longe da cena terrível, e apenas o medo da tempestade restringe nossos passos recreativos. Tal foi minha experiência quando me tornei pastor em Londres. Meu sucesso me apavorou; e o pensamento da carreira que parecia abrir, longe de me exaltar, lançou-me ao mais profundo abismo, de onde proferi meu miserere e não encontrei espaço para uma gloria in excelsis. Quem era eu para continuar a liderar uma multidão tão grande? Eu me refugiaria na obscuridade da minha aldeia, ou emigraria para a América e encontraria um ninho solitário no sertão, onde pudesse ser suficiente para as coisas que me seriam exigidas. Foi justamente então que a cortina se ergueu sobre a obra da minha vida, e eu temia o que ela poderia revelar. Espero não ter sido infiel, mas estava medroso e tomado por um senso de minha própria inaptidão. Temia o trabalho que uma graciosa providência havia preparado para mim. Sentia-me uma mera criança e tremia ao ouvir a voz que dizia: "Levanta-te, debulha os montes e faze-os como palha". Essa depressão me invade sempre que o Senhor prepara uma bênção maior para o meu ministério; a nuvem é negra antes de se dissipar e ofusca antes de derramar seu dilúvio de misericórdia. A depressão tornou-se para mim como um profeta em trajes rústicos, um João Batista, anunciando a vinda mais próxima da bênção mais rica do meu Senhor. Assim a encontraram homens muito melhores. A limpeza do navio o preparou para o uso do Mestre. A imersão no sofrimento precedeu o batismo do Espírito Santo. O jejum desperta o apetite para o banquete. O Senhor se revela no fundo do deserto, enquanto Seu servo guarda as ovelhas e aguarda em temor solitário. O deserto é o caminho para Canaã. O vale baixo leva à montanha imponente. A derrota prepara a vitória. O corvo é enviado à frente da pomba. A hora mais escura da noite precede o amanhecer. Os marinheiros descem às profundezas, mas a próxima onda os faz subir ao céu; suas almas se derretem por causa da angústia antes que Ele os leve ao porto desejado.

No meio de um longo período de trabalho ininterrupto, a mesma aflição pode ser procurado. O arco não pode ser sempre dobrado sem medo de quebrar. O repouso é tão necessário para a mente quanto o sono para o corpo. Nossos sábados são nossos dias de labuta, e se não descansarmos em algum outro dia, iremos desmoronar. Até mesmo a terra deve permanecer em pousio e ter seus sábados, e nós também. Daí a sabedoria e a compaixão de nosso Senhor, quando disse aos Seus discípulos: "Vamos ao deserto descansar um pouco". O quê! Quando o povo está desfalecendo? Quando as multidões são como ovelhas nas montanhas sem pastor? Jesus fala de descanso? ​​Quando escribas e fariseus, como lobos ferozes, estão dilacerando o rebanho, Ele leva Seus seguidores em uma excursão a um lugar tranquilo de descanso? ​​Algum fanático fervoroso denuncia tal esquecimento atroz das demandas presentes e urgentes? Que ele delire em sua tolice. O Mestre sabe que não deve exaurir Seus servos e apagar a luz de Israel. Tempo de descanso não é tempo perdido. É economia para reunir novas forças. Observe o cortador de grama num dia de verão, com tanta coisa para cortar antes do pôr do sol. Ele interrompe seu trabalho – será que é preguiçoso? Procura sua pedra e começa a puxá-la para cima e para baixo em sua foice, com "rink-a-tink--rink-a-tink--rink-a-tink". É música ociosa? Será que ele está desperdiçando momentos preciosos? Quanto ele poderia ter ceifado enquanto dedilhava aquelas notas em sua foice! Mas ele está afiando sua ferramenta e fará muito mais quando, mais uma vez, dedicar sua força àqueles longos movimentos que estendem a grama prostrada em fileiras à sua frente. Mesmo assim, uma pequena pausa prepara a mente para um serviço maior à boa causa. Os pescadores devem consertar suas redes, e nós devemos, de vez em quando, consertar nosso desperdício mental e preparar nossas máquinas para o serviço futuro. Remar dia após dia, como um escravo de galé que não conhece feriados, não convém a homens mortais. Os riachos dos moinhos continuam para sempre, mas precisamos ter nossas pausas e intervalos. Quem pode evitar ficar sem fôlego quando a corrida continua sem interrupção? Até mesmo animais de carga devem ser soltos para pastar ocasionalmente; o próprio mar para na vazante e na enchente; a terra guarda o sábado dos meses de inverno; e o homem, mesmo quando exaltado como embaixador de Deus, deve descansar ou desfalecer; deve aparar sua lâmpada ou deixá-la queimar; deve recuperar seu vigor ou envelhecer prematuramente. É sábio tirar férias ocasionais. A longo prazo, faremos mais fazendo às vezes menos. Continuar, continuar, continuar para sempre, sem recreação, pode ser adequado para espíritos emancipados deste "barro pesado", mas enquanto estivermos neste tabernáculo, devemos de vez em quando dar um basta e servir ao Senhor com santa inação e ócio consagrado. Que nenhuma consciência sensível duvide da legitimidade de se desvencilhar por um tempo, mas aprenda com a experiência de outros a necessidade e o dever de descansar em tempo oportuno.

Um golpe devastador às vezes abate o ministro. O irmão em quem mais se confiava torna-se um traidor. Judas levanta o calcanhar contra o homem que confiava nele, e o coração do pregador desfalece momentaneamente. Somos todos muito propensos a olhar para um braço de carne, e dessa propensão surgem muitas das nossas tristezas. Igualmente avassalador é o golpe quando um membro honrado e amado cede à tentação e desonra o santo nome com o qual foi nomeado. Qualquer coisa é melhor do que isso. Isso faz o pregador ansiar por uma cabana em algum vasto deserto, onde possa esconder a cabeça para sempre e não ouvir mais as zombarias blasfemas dos ímpios. Dez anos de labuta não nos tiram tanta vida quanto a que perdemos em poucas horas por Aitofel, o traidor, ou Demas, o apóstata. Disputas, divisões, calúnias e censuras tolas também têm frequentemente prostrado homens santos e os feito ir "como se tivessem uma espada cravada nos ossos". Palavras duras ferem profundamente algumas mentes delicadas. Muitos dos melhores ministros, pela própria espiritualidade de seu caráter, são extremamente sensíveis — sensíveis demais para um mundo como este. "Um coice que mal moveria um cavalo mataria um teólogo sadio." Pela experiência, a alma se endurece aos golpes ásperos que são inevitáveis ​​em nossa guerra; mas, a princípio, essas coisas nos deixam completamente atordoados e nos mandam para casa envoltos no horror de uma grande escuridão. As provações de um verdadeiro ministro não são poucas, e as causadas por professos ingratos são mais difíceis de suportar do que os ataques mais grosseiros de inimigos declarados. Que ninguém que busque tranquilidade e a quietude da vida entre no ministério; se o fizer, fugirá dele com desgosto.

A poucos coube passar por um horror de grande escuridão como o que se abateu sobre mim após o deplorável acidente no Surrey Music Hall. Fui pressionado além da conta e fora dos limites por um enorme peso de miséria. O tumulto, o pânico, as mortes estavam dia e noite diante de mim, e tornavam a vida um fardo. Então, cantei em minha tristeza:

"O tumulto dos meus pensamentos
Isso apenas aumenta minha aflição,
Meu espírito desfalece, meu coração
É desolado e baixo."
Despertei daquele sonho de horror em um instante pela graciosa aplicação à minha alma do texto: "Deus Pai o exaltou". O fato de Jesus ainda ser grande, mesmo que Seus servos sofram o que sofrerem, me conduziu de volta à calma razão e à paz. Se uma calamidade tão terrível atingir algum de meus irmãos, que ambos tenham esperança paciente e aguardem em silêncio a salvação de Deus.

Quando os problemas se multiplicam e os desânimos se sucedem em longa sucessão, como os mensageiros de Jó, então, também, em meio à perturbação da alma ocasionada por más notícias, o desânimo rouba toda a paz do coração. A queda constante desgasta pedras, e as mentes mais corajosas sentem o peso das repetidas aflições. Se um armário escasso se torna uma provação mais severa pela doença de uma esposa ou pela perda de um filho, e se as observações mesquinhas dos ouvintes são seguidas pela oposição dos diáconos e pela frieza dos membros, então, como Jacó, somos propensos a clamar: "Todas estas coisas são contra mim". Quando Davi retornou a Ziclague e encontrou a cidade incendiada, bens roubados, esposas levadas e suas tropas prontas para apedrejá-lo, lemos: "Ele se animou em seu Deus"; e bem lhe foi possível fazê-lo, pois teria desmaiado se não tivesse acreditado que veria a bondade do Senhor na terra dos viventes. As angústias acumuladas aumentam o peso umas das outras; elas se beneficiam mutuamente e, como bandos de ladrões, destroem impiedosamente nosso conforto. Onda após onda é um trabalho árduo para o nadador mais forte. O ponto onde dois mares se encontram tensiona a quilha mais navegável. Se houvesse uma pausa regulada entre os golpes da adversidade, o espírito estaria preparado; mas quando eles chegam repentina e pesadamente, como o impacto de grandes pedras de granizo, o peregrino pode muito bem se surpreender. A última gota quebra as costas do camelo, e quando essa última gota cai sobre nós, que maravilha se por um momento estivermos prontos para entregar o espírito!

Este mal também virá sobre nós, não sabemos por quê , e então é ainda mais difícil afastá-lo. A depressão sem causa não é algo que se possa argumentar, nem a harpa de Davi pode afastá-la com doces discursos. Tanto vale lutar contra a névoa quanto contra essa desesperança informe, indefinível, porém avassaladora. Ninguém se dá por satisfeito nesse caso, porque parece tão irracional, e até pecaminoso, ser perturbado sem causa manifesta; e, no entanto, o homem está perturbado, mesmo nas profundezas de seu espírito. Se aqueles que riem de tal melancolia sentissem a dor dela por uma hora, seu riso se transformaria em compaixão. A resolução poderia, talvez, afastá-la, mas onde encontraremos a resolução quando o homem inteiro está descontrolado? O médico e o teólogo podem unir suas habilidades em tais casos, e ambos se encontrarão ocupados, e mais do que ocupados. O ferrolho de ferro que tão misteriosamente fecha a porta da esperança e mantém nossos espíritos em uma prisão sombria precisa de uma mão celestial para empurrá-lo de volta; e quando essa mão é vista, clamamos com o apóstolo: "Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e Deus de toda consolação, que nos consola em toda a nossa tribulação, para que também possamos consolar os que estiverem em alguma tribulação, com a consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus" (2Co 1.3, 4). É o Deus de toda consolação que pode:

"Com doce antídoto alheio
Limpa nossos pobres seios dessa substância perigosa
Que pesa no coração."
Simão afunda até que Jesus o toma pela mão. O demônio interior dilacera e dilacera a pobre criança até que a palavra de autoridade lhe ordena que saia. Quando somos tomados por medos horríveis e oprimidos por um íncubo intolerável, precisamos apenas que o Sol da Justiça nasça, e os males gerados por nossa escuridão são afastados; mas nada menos que isso afugentará o pesadelo da alma. Timothy Rogers, autor de um tratado sobre a melancolia, e Simon Browne, escritor de alguns hinos notavelmente doces, provaram em seus próprios casos quão inútil é a ajuda do homem se o Senhor retira a luz da alma.

Se alguém se perguntar por que o Vale da Sombra da Morte precisa ser atravessado com tanta frequência pelos servos do Rei Jesus, a resposta não está longe de ser encontrada. Tudo isso promove o modo de agir do Senhor, que se resume nestas palavras: "Não por força nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor". Instrumentos serão usados, mas sua fraqueza intrínseca será claramente manifestada; não haverá divisão da glória, nem diminuição da honra devida ao Grande Trabalhador. O homem será esvaziado de si mesmo e então cheio do Espírito Santo. Em sua própria apreensão, será como uma folha seca levada pela tempestade, e então será fortalecido como um muro de bronze contra os inimigos da verdade. Esconder o orgulho do trabalhador é a grande dificuldade. Sucesso ininterrupto e alegria inabalável nele seriam mais do que nossas cabeças fracas poderiam suportar. Nosso vinho deve ser misturado com água, para que não nos perturbe o cérebro. Meu testemunho é que aqueles que são honrados publicamente por seu Senhor geralmente têm que suportar um castigo secreto ou carregar uma cruz peculiar, para que não se exaltem de forma alguma e caiam na armadilha do diabo. Quão constantemente o Senhor chama Ezequiel de "Filho do Homem"! Em meio às suas elevações aos esplendores superlativos, justamente quando, com os olhos límpidos, ele se fortalece para contemplar a glória excelente, a palavra "Filho do Homem" chega aos seus ouvidos, acalmando o coração que de outra forma poderia ter sido inebriado com a honra que lhe foi conferida. Nossas depressões sussurram em nossos ouvidos mensagens tão humilhantes, mas salutares; elas nos dizem, de uma maneira que não podemos nos enganar, que somos apenas homens, frágeis, débeis, propensos a desmaiar.

Por todas as humilhações de Seus servos, Deus é glorificado, pois eles são levados a magnificá-Lo quando Ele os põe de pé, e mesmo prostrados no pó, sua fé Lhe rende louvor. Eles falam com ainda mais doçura de Sua fidelidade e estão mais firmemente estabelecidos em Seu amor. Homens maduros como alguns pregadores idosos dificilmente teriam sido produzidos se não tivessem sido esvaziados de vaso em vaso e levados a ver seu próprio vazio e a vaidade de todas as coisas ao seu redor. Glória a Deus pela fornalha, pelo martelo e pela lima. O céu será ainda mais pleno de bem-aventurança porque fomos preenchidos com angústia aqui na terra, e a terra será melhor cultivada por causa de nosso treinamento na escola da adversidade.

A lição da sabedoria é: não se desanime com os problemas da alma. Não os considere algo estranho, mas parte da experiência ministerial comum. Se o poder da depressão for mais do que comum, não pense que tudo acabou com sua utilidade. Não rejeite sua confiança, pois ela tem grande recompensa. Mesmo que o pé do inimigo esteja em seu pescoço, espere se levantar e derrubá-lo. Lance o fardo do presente, juntamente com o pecado do passado e o medo do futuro, sobre o Senhor, que não abandona Seus santos. Viva o dia – sim, a hora. Não confie em estruturas e sentimentos. Importe-se mais com um grão de fé do que com uma tonelada de entusiasmo. Confie somente em Deus e não se apoie nas necessidades de ajuda humana. Não se surpreenda quando os amigos falharem com você: é um mundo falho. Nunca conte com a imutabilidade do homem: você pode contar com a inconstância sem medo de decepção. Os discípulos de Jesus O abandonaram; Não se surpreenda se seus adeptos se desviarem para outros mestres: assim como eles não eram tudo para você quando estavam com você, nem tudo se foi com a partida deles. Sirva a Deus com todas as suas forças enquanto a vela estiver acesa, e então, quando ela se apagar por um tempo, você terá menos do que se arrepender. Contente-se em não ser nada, pois é isso que você é. Quando seu próprio vazio for dolorosamente imposto à sua consciência, repreenda-se por jamais ter sonhado em ser pleno, exceto no Senhor. Dê pouca importância às recompensas presentes; seja grato pelos compromissos ao longo do caminho, mas busque a alegria recompensadora no além. Continue com redobrada seriedade a servir ao seu Senhor quando nenhum resultado visível estiver diante de você. Qualquer simplório pode seguir o caminho estreito na luz: a rara sabedoria da fé nos permite marchar na escuridão com precisão infalível, já que ela coloca sua mão na de seu Grande Guia. Entre este e o céu pode haver tempo ainda mais ruim, mas tudo é provido por nossa Cabeça da aliança. Em nada nos desviemos do caminho que o chamado divino nos impeliu a seguir. Venha bem ou mal, o púlpito é nossa torre de vigia, e o ministério, nossa guerra; que seja nosso, quando não podemos ver a face de nosso Deus, confiar sob A SOMBRA DE SUAS ASAS.


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A cada dia, cada um de nós que cremos em Jesus Cristo temos:
Deus para glorificar,
Jesus para imitar,
salvação para desenvolver com temor e tremor,
um corpo para glorificar a Deus,
pecados para confessar,
virtudes para adquirir,
o inferno para evitar e o céu para alcançar.
A eternidade para não perder de vista,
o tempo para remir,
vizinhos para servir,
o mundo para desfrutar e a criação para cuidar.
Ofensas para pacientemente suportar,
bondades para voluntariamente praticar,
justiça para almejar,
tentações para vencer,
a morte para possivelmente sofrer,
e, em tudo isto,
o amor de Deus para nos sustentar.

– Bp. Walter Mcalister

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